Cinco razões para regressar a São Miguel

1. Parque da Grená


Foi inaugurado em Dezembro do ano passado, mas fechou pouco tempo depois devido à pandemia e só voltou a abrir em Julho, pelo que se mantém como uma das principais novidades na ilha. São 18 hectares de floresta, com cerca de cinco quilómetros de trilhos para percorrer, entre cascatas, pequenos miradouros e zonas de descanso ou de piquenique e um antigo palacete em ruínas.

A história da propriedade remonta a 1832, quando o terreno junto à lagoa das Furnas foi adquirido por um viajante inglês, para aqui construir uma casa de Verão – algo que só viria a acontecer em 1858, já pelo proprietário seguinte, Vines, então cônsul inglês em Ponta Delgada. Dá à quinta o nome de Grená em homenagem à mulher, saudosa das férias de Verão que passava durante a infância na Irlanda, numa casa de família com o mesmo nome.

Ao longo dos anos, a propriedade foi passando por diferentes mãos até que, em 1987, o governo português adquiriu-a, com o intuito de recuperar o edifício histórico e ali alojar altas figuras do Estado em visita a São Miguel. A ideia nunca chega a concretizar-se e a Grená ficou ao abandono até ser doada ao governo regional dos Açores em 2015. Três anos depois, foi vendida em hasta pública a um grupo de investidores estrangeiros por 500 mil euros e, após um ano de trabalhos de limpeza e requalificação, abriu ao público, gerido pela Feliz Terra.


casa senhorial mantém-se em ruínas, não podendo ser visitada (apenas por fora), mas Norberto Botelho, administrador da empresa, avançava à agência Lusa em Dezembro que o objectivo passa por recuperar o edifício para fins turísticos, embora não se comprometesse com prazos nem adiantasse pormenores do projecto.

Uma das principais atracções do parque é o “salto da inglesa”, lá bem no topo da encosta. Mas, para subir lá acima, é preciso galgar 633 degraus em nova escadaria de madeira. Nos meses de Verão, a cascata não costuma ter muita água, pelo que optámos por mirá-la cá de baixo, confessamos. Mas “vale a pena”, apesar de ser uma subida “muito íngreme” e “um bocadinho dura”, garantem Liliana e Sérgio, ela de cá, ele do Seixal, ambos de férias na ilha. Só para chegar lá acima demoram-se cerca de 35 a 40 minutos, degrau a degrau, conta Sérgio, de 28 anos. É a primeira vez que visita a Grená e o parque, diz, é “espectacular”. “Está muito acessível.”

Para alguns, o problema poderá estar antes no preço: a entrada custa 10€ (para os residentes no arquipélago o valor dá direito a cinco entradas, para os restantes é bilhete único e gratuito para crianças até aos 12 anos). Mas, para aceder, é preciso passar pelo parque das caldeiras das Furnas, que custa 3€ (com direito a estacionamento). O ideal será aproveitar para visitar os dois espaços numa única ida (não se esqueça que os cozidos são retirados das fumarolas durante a manhã).

Também pode optar por começar a caminhada no jardim da Lagoa das Furnas (estacionamento pago) e fazer parte do trilho em redor do espelho de água até à Grená (entre 30 a 40 minutos; o percurso completo, com 9,5 km, demora cerca de três horas). Tanto o jardim da lagoa como a zona das caldeiras têm espaços de piquenique, ideais para uma pausa ao almoço ou lanche. Remate o passeio, à chegada ou à saída, com uma passagem pelo miradouro do Pico do Ferro, para vistas panorâmicas sobre a lagoa e a vila das Furnas.




2. Trilho das Quatro Fábricas da Luz


Este percurso pedestre, próximo de Água de Alto (concelho de Vila Franca do Campo), foi oficialmente inaugurado em 2017, mas é ainda pouco conhecido. É uma óptima sugestão para quem estiver a explorar esta zona da ilha e quiser esticar as pernas num trilho relativamente fácil e com direito a banhos de cascata ou uma alternativa para aqueles dias em que as lagoas se escondem no nevoeiro e a meteorologia se fecha em São Miguel.

O trilho chama-se Quatro Fábricas da Luz porque, ao longo do caminho, vão-se encontrando ruínas de antigas unidades de produção de energia eléctrica, gerada a partir da força da água que desce desde a lagoa do Fogo, rumo ao mar. Remontam ao final do século XIX e inícios do século XX, retratando o início da produção e distribuição de energia eléctrica a partir de fontes renováveis na ilha, instaladas por José Cordeiro. Hoje em dia, a principal fonte de energia renovável em São Miguel é a geotérmica (acima de 45%), enquanto a energia hidroeléctrica representa cerca de 5%.

O percurso pedestre assinalado começa junto ao reservatório de água que actualmente abastece a Central Mini Hídrica da Ribeira da Praia, construída em 1990, uma das duas que se mantêm em funcionamento. Desce-se depois até aos edifícios da Fábrica da Cidade, em funcionamento entre 1904 e 1974. Em ruínas, conserva ainda os velhos equipamentos, como turbinas hidráulicas, os alternadores ou a conduta de água.

Pouco depois, chega-se à antiga Fábrica da Vila, a primeira central hidroeléctrica da ribeira da Praia, construída em 1899 para abastecer Vila Franca do Campo. O caminho segue por uma mata de incensos e acácias, passa por baixo de um viaduto e próximo de campos de cultivo para terminar na “cascata do segredo”. A água é fria mas o mergulho recompensador. Para aventureiros com vontade de saltar de corda para a água, o “poço dos 30 reis” fica um pouco mais à frente. O trilho termina junto ao casario do Lugar da Praia, onde fica a antiga Fábrica da Praia, entretanto transformada em Núcleo Museológico da Electricidade.

O percurso é linear e tem 2,1 km de extensão, percorridos em cerca de 1h30. Se tiver de voltar ao ponto de partida a pé, tenha em atenção que será tudo a descer até à cascata, para depois subir – ou vice-versa, caso deixe o carro junto ao Lugar da Praia.

A não perder num passeio por esta zona da ilha: Vila Franca do Campo (e as suas afamadas queijadas ou o fotogénico ilhéu, acessível por transporte fluvial junto ao cais) e a Caloura, para mergulhos, conversas com os pescadores ou petiscadas de marisco e peixe fresco no afamado Bar da Caloura. Em 2017, os mesmos proprietários abriram A Casa do Abel, em Água de Pau, um restaurante especializado em carne que, dizem-nos, também está a fazer sucesso, embora não tenhamos tido tempo para comprovar. Para vistas panorâmicas sobre a Caloura, suba ao miradouro do Pisão.




3. Piquenique na Lagoa das Sete Cidades


Vista do Rei está em todos os postais e, se der um salto ao miradouro da Grota do Inferno (o pequeno trilho parte junto à lagoa do Canário), pode até ver as quatro lagoas que se aninham nesta zona da ponta Oeste da ilha: a Rasa à esquerda, Santiago em baixo, a Azul à direita e, com alguma dose de imaginação, a Verde ali no meio, compondo a icónica lagoa das Sete Cidades. Mas são poucos aqueles que acabam por descer até às margens do espelho de água.

Na ponte que separa os dois lagos chorados pelos amantes que protagonizam a lenda das Sete Cidades, siga pela estrada de terra batida do Cerrado das Freiras até ao jardim da lagoa Azul. E prepare-se para um piquenique. Nos fins-de-semana de Verão, estando o tempo de feição, são muitos os micaelenses que aproveitam para fazer uma almoçarada ao ar livre. Os parques de merendas parecem brotar de cada recanto de estrada ou pedaço de jardim e estão todos bem compostos de gente, pelo menos ao sábado e ao domingo.

Como o jardim da lagoa Azul é amplo, há muito espaço para estender as mantas e conviver. César Fernandes trouxe a família e um casal amigo, todos de freguesias vizinhas do concelho de Ponta Delgada. Sem festas de Verão pelas aldeias devido à covid-19, esta é uma forma de se juntarem para um dia diferente, conta. Costumam fazer um piquenique “quatro ou cinco vezes” por ano, “sempre que é possível” juntar o grupo, e acabam por vir para as Sete Cidades porque “fica mais próximo”, tem “bons locais” e “natureza”.

O tambor de uma máquina de lavar foi aproveitado para construir um grelhador, trazido de casa (para apanhar um dos disponíveis no parque de merendas, em pedra, há que chegar cedo, avisa César), e o lume está quase pronto para assar umas sardinhas, bifanas e galinha já temperada. Para acompanhar, batatas recheadas com pimenta da terra e bolo de cenoura, entre outras iguarias.




4. Ribeira dos Caldeirões


Foi a cascata mais imponente com que nos cruzámos por estes dias, tanto em altura como em força de fluxo, assim todo o ano. E nem é preciso sair do carro para vê-la, dado romper tão perto da estrada. No entanto, vale bem a pena estacionar e percorrer todo o Parque Natural da Ribeira dos Caldeirões.

Fica na freguesia da Achada, no concelho do Nordeste, menos explorado turisticamente e por isso ainda com muito por desbravar. Acaba por ser uma das zonas predilectas para a prática do canyoning em São Miguel, mas o parque também pode ser explorado a pé.

O trilho por esta área protegida, que se aninha nos vales traçados pela ribeira do Guilherme, na serra da Tronqueira, é curto e conduz-nos por diversas cascatas (dá para mergulhar em, pelo menos, uma delas) e cinco moinhos de água (um deles aberto a visitas ao engenho, no interior). Datam do século XVI e existem muitos outros no Nordeste, outrora a única fonte de rendimento de muitas famílias da região.

As casas do moleiro foram transformadas em loja de artesanato, posto de turismo, unidade de turismo rural e café. No percurso, destacam-se ainda o manto florestal de laurissilva e os fetos arbóreos, ainda que a conteira, uma planta invasora, esteja em larga expansão.




5. Ferraria: água termal em tempos de covid


Não é que a Ferraria seja propriamente um segredo mal guardado de São Miguel, mas ganha destaque em tempos de pandemia. Como medida de precaução contra o surto de covid-19, os mergulhos quentes mais famosos da ilha estão interditos ao público – leia-se tanque de água termal do Parque Terra Nostra, Poça da Dona Beija, Caldeira Velha ou mesmo as termas da Ferraria – restando apenas alguns recantos conhecidos pelos locais e duas praias que, sendo atlânticas, ficam junto a nascentes termais.


É o caso da praia do Fogo, na freguesia da Ribeira Quente, onde uma faixa de areal fica próximo de várias nascentes hidrotermais submarinas, que aquecem a água, principalmente na maré vazia. E a piscina natural da Ferraria, nos Ginetes, uma língua escavada na rocha vulcânica onde um fluxo de água quente cruza com o fresco do oceano.A estância conta com balneários, nadador-salvador e outras valências. Mas, para caminhar sobre as rochas e descer à água é aconselhável usar calçado aquático. Dadas as dimensões da piscina natural, ainda que a covid-19 tenha esvaziado a ilha de turistas, é um lugar popular entre os locais, principalmente ao fim-de-semana. Para apanhar a água quente, quente, há que ir durante o período da maré baixa.

Publicado Em:
Domingo, Outubro 6, 2024 20:00:37
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